segunda-feira, setembro 03, 2007

Sympathy for Mr. Vengeance, de Park Chan-Wook


Ambiguidade moral

"Sympathy for Mr. Vengeance", o primeiro da trilogia de Park Chan-Wook em relação ao complexo tema que á a vingança, é o mais cru, o mais brutal e o mais trágico dos três filmes. O filme conta a história de um jovem surdo que, de forma a obter o dinheiro necessário para o transplante de fígado que a irmã necessita, rapta uma rapariga de forma a pedir um resgate ao pai. A história vai-se lentamente desenvolvendo numa história de vingança em que o espectador é confrontado com a questão colocada no próprio título do filme: o filme possui dois "senhores vingança"... mas para qual deles vai a nossa simpatia? Ambos têm uma razão para o seu desejo vingativo, ambos são personagens consumidos por esse desejo. Nenhum deles é um herói, nem nenhum deles é um vilão... estão apenas consumidos por um desejo que nasceu de uma dor que nenhum deles consegue controlar. Como diz, a certa altura do filme, uma das personagens para outra: "Eu sei que és um bom tipo... mas sabes porque é que te tenho de matar, não sabes?".

O filme é todo ele uma (poderosa, deprimente e trágica) experiência. Park Chan-Wook filmou esta obra de uma forma... crua, mas ao mesmo tempo poética. Os ângulos todos eles magnificamente calculados, os efeitos sonoros do ambiente desconcertantes e usados de forma perfeita, e a banda-sonora do mais minimalista possível aparece em momentos apenas estritamente necessários para dar ao filme um tom ainda mais trágico, cru, e poderoso. O filme tem apenas os diálogos necessários, sendo esta uma obra que fala maioritariamente através de longos planos repletos de uma poesia trágica como raramente vemos no cinema. O filme está, ainda assim, repleto de pequenas pitadas de um extremamente subtil humor negro... algo que ajuda ainda mais a estimular o tom tão característico desta obra-prima.

Os actores fazem todos eles um trabalho fabuloso (com uma pequena menção especial para a adorável rapariga que faz de raptada... de uma inocência e jovialidade tocante). O filme trata as suas personagens como seres humanos, com as suas falhas e as suas qualidades. Lentamente, todas elas vão caindo numa espiral que não podem controlar. Uma espiral de vingança e de dor.

Em "Oldboy", Park filmou a vingança como extremo do ser humando... um extremo da nossa decadência, da nossa obcessão. Em "Lady Vengeance", filmou a vingança como um acto que, apesar de por vezes talvez podendo ser considerado "justo", nunca traz aquilo que o vingador deseja verdadeiramente: redenção... ou o desejo do regresso de uma certa paz. Em "Sympathy for Mr. Vengeance" a vingança é um acto humano.... e, como grande parte dos actos humanos, é ambíguo. Existe sempre um outro lado, existe sempre uma consequência. E essa consequência nunca pode ser controlada.

Sendo Park um realizador com um estilo algo expressionista (podemos, pois, compará-lo a Aronosky) este queria que, ao longo de "Sympathy for Mr. Vengeance", a cor fosse lentamente desaparecendo, até que a meio do filme este se tornasse a preto-e-branco. Infelizmente, o orçamento do filme não permitiu o uso de tal efeito. É uma pena, já que (e uso agora as palavras de Jamie Russel, crítico de cinema) "essa técnica teria sido perfeitamente adequada a este tour de force niilista, no qual não existem as cores preto e branco... apenas tons de cinzento".

"Sympathy for Mr. Vengeance" é um filme tão deprimente e poderoso quanto obrigatório, e seria apenas a primeira de apenas três obras-primas que criariam uma das mais incríveis trilogias jamais vistas no cinema. Trilogia essa que revelou Park Chan-Wook como um dos grandes visionários do cinema contemporâneo.



10/10

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